sábado, 30 de abril de 2011

«Os Lusíadas de Calções»

A Companhia de Teatro O Sonho representou «Os Lusíadas de Calções».
Um espectáculo que apresenta uma adaptação d'Os Lusíadas de Luís Vaz de Camões, realizada por Ruy Pessoa.
«Os Lusíadas de Calções» constituem uma excelente dramatização do grandioso poema épico de Camões. Os actores desenvolvem um papel extraordinário e unem aquilo que é sério a uma faceta mais divertida e o resultado é um espectáculo magnificamente bem composto e equilibrado, dando-nos uma excelente visão da épica camoniana.
Nós recomendamos este espectáculo, inspirado n'Os Lusíadas de Camões.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

João Baião representa Camões

A peça "A Casa da Fama" estreou no dia 27 de Abril, no Teatro Armando Cortez.
João Baião, para além de representar o papel de Camões, é ainda encenador desta peça.
No elenco, participam também Ana Brito e Cunha e Mané Ribeiro.
Os autores são Frederico Pombares, Henrique Dias e Roberto Pereira.
O público pode assistir à representação de Quinta a Sábado às 21.30 horas e ao Domingo às 17 horas.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Constância, Terra Natal de Luís de Camões

Onde nasceu Camões, o poeta genial de todos os tempos?
Camões nasceu em Constância.

Constância pertence ao Distrito de Santarém. O topónimo de Constância foi atribuído pela Rainha D. Maria II, em 1833.
Para além de ser a terra natal de Luís Vaz de Camões, tem muitos outros motivos para ser visitada, nomeadamente as pessoas que são extremamente simpáticas e acolhedoras, a gastronomia dá água na boca e há muito para ver e visitar, por exemplo, o Observatório astronómico de Constância, o Pelourinho, a Igreja Matriz e a Igreja da Misericórdia de Constância.
Nós vimos isto tudo no Programa das Festas da RTP1, que foi realizado em directo de Constância, e gostámos muito!

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Dicionário de Luís de Camões, Professor Aguiar e Silva

O Dicionário de Luís de Camões da Editorial Caminho constitui uma obra de referência para o estudo camoniano. Esta obra foi coordenada pelo Professor Aguiar e Silva e teve a colaboração de mais de 60 especialistas portugueses e estrangeiros.
O Professor Aguiar e Silva referiu que este dicionário "irá permanecer durante muitos anos como um marco nos estudos camonianos".
O Professor, camoniano até à medula, tem vários estudos sobre o poeta e sobre a sua obra. Destacamos os seguintes:
Camões, Labirintos e Fascínios (1994);
A Lira Dourada e a Tuba Canora: Novos Ensaios Camonianos (2008);
Jorge de Sena e Camões. Trinta Anos de Amor e Melancolia (2010).
Não podemos esquecer que o Professor Aguiar e Silva também coordenou a criação do Instituto Camões.

terça-feira, 26 de abril de 2011

III - A Memória de Camões e/ou Camões na Memória

A herança de Camões é vastíssima. A sua obra está viva na nossa cultura, na nossa língua, na nossa história e no nosso povo.
O legado que nos deixou tem sido, ao longo dos séculos, um manâncial à disposição de todos. São inúmeros os autores estrangeiros a apresentarem nas suas obras relações de intertextualidade com Camões. Por outro lado, os autores portugueses que, nas suas obras, dedicam poemas ou textos ou, simplesmente, fazem referências inter e intra-textuais são, como tivemos ocasião de verificar, ao longo do nosso estudo, muitos, muitos!
O dia 10 de Junho, Dia de Portugal e de Camões, é também um pequeno tributo ao enorme talento deste homem singularmente genial.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

II - Significado do Prémio Camões

O Prémio Camões foi instituído em 1988, com o acordo dos governos de Portugal e do Brasil.
Este prémio distingue os autores de língua portuguesa que fazem jus à frase pessoana: "A minha pátria é a língua portuguesa.", ou seja, aqueles que "por obras valerosas", sem faltar o "engenho e arte", "Se vão da lei da morte libertando".
É, sem dúvida, um pequeno tributo ao Príncipe dos Poetas Portugueses!

Quem já recebeu o Prémio Camões?

1989, Miguel Torga;
1990, João Cabral de Melo Neto;
1991, José Craveirinha;
1992, Vergílio Ferreira;
1993, Rachel de Queiroz;
1994, Jorge Amado;
1995, José Saramago;
1996, Eduardo Lourenço;
1997, Pepetela (Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos);
1998, António Cândido de Mello e Sousa;
1999, Sophia de Mello Breyner Andresen;
2000, Autran Dourado;
2001, Eugénio de Andrade;
2002, Maria Velho da Costa;
2003, Rubem Fonseca;
2004, Agustina Bessa-Luís;
2005, Lygia Fagundes Telles;
2006, José Luandino Vieira;
2007, António Lobo Antunes;
2008, João Ubaldo Ribeiro;
2009, Arménio Vieira;
2010, Ferreira Gullar;
2011, Manuel António Pina.

domingo, 24 de abril de 2011

I - Camões, Ontem, Hoje e Sempre

Luís Vaz de Camões foi, certamente, um dos mendigos mais sábios, em Portugal.
Como é possível um homem tão ilustre passar a vida toda sem ter/ver o seu talento, o seu trabalho (re)conhecido?
Fica aqui a pergunta, pois a nós causa-nos grande perplexidade! Como é possível ninguém o ter compreendido, ninguém foi capaz de compreendê-lo inteiramente, porque ele era grande para os do seu tempo!
Pois, na nossa perspectiva,  o que lhe foi atribuído, em vida, foi manifestamente insuficiente.
Só Jau compreendeu, plenamente, a sua densidade humana e foi capaz de mendigar pão e sopa, para que o Príncipe dos Poetas não morresse de fome!
Até quando teimaremos nesta falta de atenção a tudo?

sábado, 23 de abril de 2011

23 de Abril, Camões em Diálogo com Ana Hatherly

Leonorana

«Descalça vai para a fonte
  Leonor pela verdura
  Vai formosa e não segura» Camões


Variação II

quando leonor pela manhã estava nua
acorda e sente essa verdura irmã da
formosura das fontes e da verdura
estende o pé e pisa o chão descalça
e treme de verdura pela formosura da
manhã primeiro jacto da fonte da verdura
seu pé descalço treme de frio como tremem
as faces da verdura abrindo suas bocas
à aragem fria da manhã segura como a
fonte segura da verdura da aurora e nua
como leanor fremente pela verdura e tão
formosa como a fonte que irrompe de
súbito como o dia estende o pé descalço
para fora do leito da fundura da noite
em que dormem as fontes a verdura a
formosura e leanor insegura ergue-se a
caminho pela verdura e na verdura colhe
formosura vai para a fonte nua

Ana Hatherly, Anagramático




23 de Abril, Dia Mundial do Livro

Hoje, é o Dia Mundial do Livro e é o dia em que termina o Festival Camoniano, iniciado no dia 21 de Março, Dia Mundial da Poesia.
Ao longo deste tempo, realizámos vários trabalhos sobre Luís Vaz de Camões e sobre a sua poesia.
Através do Poema do Dia, organizámos uma espécie de antologia camoniana pessoal que muito nos enobreceu.
Por outro lado, Camões em Diálogo com outro poeta fez-nos compreender a extensão de poetas/escritores que admiram Camões e que, por isso, escreveram para o homenagear.
São tantos que foi difícil escolher, por isso, optámos por aqueles que gostámos mais de ler.

22 de Abril, Poema do Dia

Em prisões baixas fui um tempo atado,
vergonhoso castigo de meus erros;
inda agora arrojando levo os ferros
que a Morte, a meu pesar, tem já quebrado.

Sacrifiquei a vida a meu cuidado,
que Amor não quer cordeiros, nem bezerros;
vi mágoas, vi misérias, vi desterros:
parece-me qu'estava assi ordenado.

Contentei-me com pouco, conhecendo
que era o contentamento vergonhoso,
só por ver que cousa era viver ledo.

Mas minha estrela, que eu já'gora entendo,
a Morte cega, e o Caso duvidoso,
me fizeram de gostos haver medo.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

21 de Abril, Poema do Dia

Amor, co a esperança já perdida,
teu soberano templo visitei;
por sinal do naufrágio que passei,
em lugar dos vestidos, pus a vida.

Que queres mais de mim, que  destruída
me tens a glória toda que alcancei?
Não cuideis de forçar-me, que não sei
tornar a entrar onde não há saída.

Vês aqui alma, vida e esperança,
despojos doces de meu bem passado,
enquanto quis aquela que eu adoro:

nelas podes tomar de mim vingança;
e se inda não estás de mim vingado,
contenta-te com as lágrimas que choro.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

20 de Abril, Poema do Dia

Cara minha inimiga, em cuja mão
pôs meus contentamentos a ventura,
faltou-te a ti na terra sepultura,
porque me falte a mim consolação.

Eternamente as águas lograrão
a tua peregrina fermosura;
mas, enquanto me a mim a vida dura,
sempre viva em minh'alma te acharão.

E se meus rudos versos podem tanto
que possam prometer-te longa história
daquele amor tão puro e verdadeiro,

celebrada serás sempre em meu canto;
porque enquanto no mundo houver memória,
será minha escritura teu letreiro.

terça-feira, 19 de abril de 2011

19 de Abril, Poema do Dia

Tomou-me vossa vista soberana
adonde tinha armas mais à mão,
por mostrar que quem busca defensão
contra esses belos olhos, que s'engana.

Por ficar da vitória mais ufana
deixou-me armar primeiro da Razão;
cuidei de me salvar, mas foi em vão,
que contra o Céu não val defensa humana.

Mas porém se vos tinha prometido
o vosso alto destino esta vitória,
ser-vos tudo bem pouco está sabido.

Que, posto que estivesse apercebido,
não levais de vencer-me grande glória:
maior a levo eu de ser vencido.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

18 de Abril, Poema do Dia

Leda serenidade deleitosa,
que representa em terra um paraíso;
entre rubis e perlas doce riso,
debaixo d'ouro e neve, cor de rosa;

presença moderada e graciosa,
onde ensinandomestão despejo e siso
que se pode por arte e por aviso,
como por natureza ser fermosa;

fala de quem a morte e a vida pende,
rara, suave; enfim, Senhora, vossa;
repouso nela alegre e comedido;

estas as armas são com que me rende
e me cativa Amor; mas não que possa
despojar-me da glória de rendido.

domingo, 17 de abril de 2011

17 de Abril, Camões em Diálogo com Jorge de Sena

Uma Estrofe de Camões

Alma minha
gentil
que te partiste

tão cedo desta vida descontente
desta vida descontente tão cedo
descontente tão cedo desta vida
desta vida tão cedo descontente
descontente desta vida tão cedo
tão cedo descontente desta vidas

sábado, 16 de abril de 2011

16 de Abril, Camões em Diálogo com Sophia de Mello Breyner Andresen

Soneto à Maneira de Camões

Esperança e desespero de alimento
Me servem neste dia em que te espero
E já não sei se quero ou se não quero
Tão longe de razões é o meu tormento.

Mas como usar amor de entendimento?
Daquilo que te peço desespero
Ainda que m'o dês - pois o que eu quero
Ninguém o dá senão por um momento.

Mas como és belo, amor, de não durares,
De ser tão breve e fundo o teu engano,
E de eu te possuir sem tu te dares.

Amor perfeito dado a um ser humano:
Também morre o florir de mil pomares
E se quebram as ondas no oceano.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

15 de Abril, Poema do Dia

Ditoso seja aquele que somente
se queixa de amorosas esquivanças;
pois por elas não perde as esperanças
de poder n'algum tempo ser contente.

Ditoso seja quem, estando ausente,
não sente mais que a pena das lembranças;
porqu', inda que se tema de mudanças,
menos se teme a dor quando se sente.

Ditoso seja, enfim, qualquer estado
onde enganos, desprezos e isenção
trazem o coração atormentado.

Mas triste quem se sente magoado
d'erros em que não pode haver perdão,
sem ficar n'alma a mágoa do pecado.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

14 de Abril, Poema do Dia

Quando de minhas mágoas a comprida
maginação os olhos me adormece,
em sonhos aquel'alma me aparece
que para mim foi sonho nesta vida.

Lá numa soidade, onde estendida
a vista pelo campo desfalece,
corro par'ela; e ela então parece
que mais de mim se alonga, compelida.

Brado:_Não me fujais, sombra benina!
Ela (os olhos em mim cum brando pejo,
como quem diz que já não pode ser),

torna a fugir-me; e eu, gritando:_Dina...
antes que diga mene, acordo, e vejo
que nem um breve engano posso ter.

13 de Abril, Poema do Dia

Conversação doméstica afeiçoa,
ora em forma de boa e sã vontade,
ora d'uma amorosa piedade,
sem olhar qualidade de pessoa.

Se despois, porventura, vos magoa
com desamor e pouca lealdade,
logo vos faz mentira da verdade
o brando Amor, que tudo em si perdoa.

Não são isto que falo conjecturas,
que o pensamento julga na aparência,
por fazer delicadas escrituras.

metido tenho a mão na consciência,
e não falo senão verdades puras
que m'ensinou a viva experiência.

terça-feira, 12 de abril de 2011

12 de Abril, Poema do Dia

Correm turvas as águas deste rio,
que as do Céu e as do monte as enturbaram;
os campos florecidos se secaram,
intratável se fez o vale, e frio.

Passou o verão, passou o ardente estio,
umas cousas por outras se trocaram;
os fementidos Fados já deixaram
do mundo o regimento, ou desvario.

Tem o tempo sua ordem já sabida;
o mundo, não, mas anda tão confuso,
que parece que dele Deus se esquece.

Casos, opiniões, natura e uso
fazem que nos pareça desta vida
que não há nela mais que o que parece.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

11 de Abril, Poema do Dia

Que me quereis, perpétuas saudades?
Com que esperança ainda m'enganais?
Que o tempo que se vai não torna mais,
e se torna, não tornam as idades.

Razão é já, ó anos!, que vos vades,
porque estes tão ligeiros que passais,
nem todos para um gosto são iguais,
nem sempre são conformes as vontades.

Aquilo a que já quis é tão mudado
que quási é outra cousa; porque os dias
têm o primeiro gosto já danado.

Esperanças de novas alegrias
não mas deixa a Fortuna e o Tempo errado,
que do contentamento são espias.

domingo, 10 de abril de 2011

10 de Abril, Camões em Diálogo com Herberto Helder

Amiguinhos, hoje, escolhemos um poema de Herberto Helder e também apresentamos o soneto camoniano que está na base deste diálogo de poemas. Esperamos que gostem e apreciem!

Boas Leituras!

P.S. Podem continuar a acompanhar o «Poema do Dia», aqui, no blogue!

 

"Transforma-se o amador na coisa amada"


«Transforma-se o amador na coisa amada», com seu
feroz sorriso, os dentes,
as mãos que relampejam no escuro. Traz ruído
e silêncio. Traz o barulho das ondas frias
e das ardentes pedras que tem dentro de si.
E cobre esse ruído rudimentar com o assombrado
silêncio da sua última vida.
O amador transforma-se de instante para instante,
e sente-se o espírito imortal do amor
criando a carne em extremas atmosferas, acima
de todas as coisas mortas.

Transforma-se o amador. Corre pelas formas dentro.
E a coisa amada é uma baía estanque.
É o espaço de um castiçal,
a coluna vertebral e o espírito
das mulheres sentadas.
Transforma-se em noite extintora.
Porque o amador é tudo, e a coisa amada
é uma cortina
onde o vento do amador bate no alto da janela
aberta. O amador entra
por todas as janelas abertas. Ele bate, bate, bate.
O amador é um martelo que esmaga.
Que transforma a coisa amada.

Ele entra pelos ouvidos, e depois a mulher
que escuta
fica com aquele grito para sempre na cabeça
a arder como o primeiro dia do verão. Ela ouve
e vai-se transformando, enquanto dorme, naquele grito
do amador.
Depois acorda, e vai, e dá-se ao amador,
dá-lhe o grito dele.
E o amador e a coisa amada são um único grito
anterior de amor.

E gritam e batem. Ele bate-lhe com o seu espírito
de amador. E ela é batida, e bate-lhe
com o seu espírito de amada.
Então o mundo transforma-se neste ruído áspero
do amor. Enquanto em cima
o silêncio do amador e da amada alimentam
o imprevisto silêncio do mundo e do amor.

Herberto Helder



Transforma-se o amador na cousa amada,
por virtude do muito imaginar;
não tenho, logo, mais que desejar,
pois em mim tenho a parte desejada.

Se nela está minh' alma transformada,
que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente pode descansar,
pois consigo tal alma está liada.

Mas esta linda e pura semideia,
que, como um acidente em seu sujeito,
assi co a alma minha se conforma,

está no pensamento como ideia:
(e) o vivo e puro amor de que sou feito,
como a matéria simples busca a forma.

Luís de Camões

sábado, 9 de abril de 2011

9 de Abril, Camões em Diálogo com Miguel Torga

Miguel Torga dedica esta ode aos poetas, ao Príncipe de todos os poetas, que é Luís Vaz de Camões, o Poeta de Língua Portuguesa, por excelência. Leiam e apontem os traços de intertextualidade, depois falamos, na aula de Estudo Acompanhado.


Aos Poetas


Somos nós
As humanas cigarras.
Nós,
Desde o tempo de Esopo conhecidos...
Nós,
Preguiçosos insectos perseguidos.

Somos nós os ridículos comparsas
Da fábula burguesa da formiga.
Nós, a tribo faminta de ciganos
Que se abriga
Ao luar.
Nós, que nunca passamos,
A passar...

Somos nós, e só nós podemos ter
Asas sonoras.
Asas que em certas horas
Palpitam.
Asas que morrem, mas que ressuscitam
Da sepultura.
E que da planura
Da seara
Erguem a um campo de maior altura
A mão que só altura semeara.

Por isso a vós, Poetas, eu levanto
A taça fraternal deste meu canto,
E bebo em vossa honra o doce vinho
Da amizade e da paz.
Vinho que não é meu,
Mas sim do mosto que a beleza traz.

E vos digo e conjuro que canteis.
Que sejais menestréis
Duma gesta de amor universal.
Duma epopeia que não tenha reis,
Mas homens de tamanho natural.

Homens de toda a terra sem fronteiras.
De todos os feitios e maneiras,
Da cor que o sol lhes deu à flor da pele.
Crias de Adão e Eva verdadeiras.
Homens da torre de Babel.

Homens do dia-a-dia
Que levantem paredes de ilusão.
Homens de pés no chão,
Que se calcem de sonho e de poesia
Pela graça infantil da vossa mão.

Miguel Torga, in 'Odes'


sexta-feira, 8 de abril de 2011

8 de Abril, Poema do Dia

Eu cantei já, e agora vou chorando
o tempo que cantei tão confiado;
parece que no canto já passado
se estavam minhas lágrimas criando.

Cantei; mas se me alguém pergunta: _Quando?
_Não sei; que também fui nisso enganado.
É tão triste este meu presente estado
que o passado, por ledo, estou julgando.

Fizeram-me cantar, manhosamente,
contentamentos não, mas confianças;
cantava, mas já era ao som dos ferros.

De quem me queixarei, que tudo mente?
Mas eu que culpa ponho às esperanças
onde a Fortuna injusta é mais que os erros?

quinta-feira, 7 de abril de 2011

7 de Abril, Poema do Dia

O céu, a terra, o vento sossegado...
As ondas, que se estendem pela areia...
Os peixes, que no mar o sono enfreia...
O nocturno silêncio repousado...

O pescador Aónio, que, deitado
onde co vento a água se meneia,
chorando, o nome amado em vão nomeia,
que não pode ser mais nomeado:

_Ondas (dezia), antes que Amor me mate
torna-me a minha Ninfa, que tão cedo
me fizestes à morte estar sujeita.

Ninguém lhe fala; o mar de longe bate,
move-se brandamente o arvoredo;
leva-lhe o vento a voz, que ao vento deita.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

6 de Abril, Poema do Dia

Dizei, Senhora, da Beleza ideia:
para fazerdes esse áureo crino,
onde fostes buscar esse ouro fino?
de que escondida mina ou de que veia?

Dos vossos olhos essa luz Febeia,
esse respeito, de um império dino?
Se o alcançastes com saber divino,
se com encantamentos de Medeia?

De que escondidas conchas escolhestes
as perlas preciosas orientais
que, falando, mostrais no doce riso?

Pois vos formastes tal, como quisestes,
vigiai-vos de vós, não vos vejais,
fugi das fontes: lembre-vos Narciso.

terça-feira, 5 de abril de 2011

5 de Abril, Poema do Dia

Cá nesta Babilónia, donde mana
matéria a quanto mal o mundo cria;
cá onde o puro Amor não tem valia,
que a Mãe, que manda mais, tudo profana;

cá, onde o mal se afina, e o bem se dana,
e pode mais que a honra e tirania;
cá, onde a errada e cega Monarquia
cuida que um nome vão a desengana;

cá, neste labirinto, onde a nobreza
com esforço e saber pedindo vão
às portas da cobiça e da vileza;

cá neste escuro caos de confusão,
cumprindo o curso estou da natureza.
Vê se me esquecerei de ti, Sião!

segunda-feira, 4 de abril de 2011

4 de Abril, Poema do Dia

Aqueles claros olhos que, chorando
ficavam quando deles me partia,
agora que farão? Quem mo diria?
Se porventura estarão em mim cuidando?

Se terão na memória, como ou quando
deles me vim tão longe de alegria?
Ou s'estarão aquele alegre dia
que torne a vê-los, n'alma figurando?

Se contarão as horas e os momentos?
Se acharão num momento muitos anos?
Se falarão co as aves e cos ventos?

Oh! bem-aventurados fingimentos,
que nesta ausência tão doces enganos
sabeis fazer aos tristes pensamentos!

domingo, 3 de abril de 2011

3 de Abril, Camões em Diálogo com António Gedeão

António Gedeão escreveu o «Poema da Auto-estrada», glosando com a cantiga camoniana, intitulada «Descalça vai para a fonte», para homenagear Camões, o Príncipe dos Poetas Lusos.
Caros colegas, deliciem-se com os poemas, comparando-os! Depois falamos!






Poema da Auto-estrada

Voando vai para a praia
Leonor na estrada preta.
Vai na brasa, de lambreta.

Leva calções de pirata,
Vermelho de alizarina,
modelando a coxa fina
de impaciente nervura.
Como guache lustroso,
amarelo de indantreno,
blusinha de terileno
desfraldada na cintura.

Fuge, fuge, Leonoreta.
Vai na brasa, de lambreta.

Agarrada ao companheiro
na volúpia da escapada
pincha no banco traseiro
em cada volta da estrada.
Grita de medo fingido,
que o receio não é com ela,
mas por amor e cautela
abraça-o pela cintura.
Vai ditosa, e bem segura.

Como um rasgão na paisagem
corta a lambreta afiada,
engole as bermas da estrada
e a rumorosa folhagem.
Urrando, estremece a terra,
bramir de rinoceronte,
enfia pelo horizonte
como um punhal que se enterra.
Tudo foge à sua volta,
o céu, as nuvens, as casas,
e com os bramidos que solta
lembra um demónio com asas.

Na confusão dos sentidos
já nem percebe, Leonor,
se o que lhe chega aos ouvidos
são ecos de amor perdidos
se os rugidos do motor.

Fuge, fuge, Leonoreta.
Vai na brasa, de lambreta.

António Gedeão, in 'Máquina de Fogo'

Descalça vai para a fonte

Descalça vai para a fonte
Leanor pela verdura;
Vai fermosa, e não segura.

Leva na cabeça o pote,
o testo nas mãos de prata,
cinta de fina escarlata,
sainho de chamelote;
traz a vasquinha de cote,
mais branca que a neve pura.
vai fermosa, e não segura.

Descobre a touca a garganta,
cabelos d' ouro o  trançado,
fita de cor d' encarnado,
tão linda que o mundo espanta;
chove nela graça tanta,
que dá graça à fermosura.
vai fermosa, e não segura.

                  Luís de Camões

sábado, 2 de abril de 2011

2 de Abril, Camões em Diálogo com Almeida Garrett

Almeida Garrett escreveu um longo poema lírico-narrativo dedicado a Luís Vaz de Camões, do qual extraímos o seguinte:


Saudade! gosto amargo de infelizes,
(...)
_Mas dor que tem prazeres_ Saudade!
(...)
Do leito... Ai! tarde vens, auxílio do homem.
Os olhos turvos para o céu levanta;
E já no arranco extremo: _"Pátria, ao menos
juntos morremos..." E expirou coa pátria.
Onde jaz, Portugueses, o moimento
Que de imortal cantou as cinzas guarda?
Homenagem tardia lhe pagastes
No sepulcro sequer... Raça d'ingratos!
Nem isso! nem um túmulo, uma pedra,
Uma letra singela! _ A vós meu canto,
Canto de indignação, último acento
Que jamais sairá da minha lira,
A vós, ó povos do universo, o envio.
Ergo-me a delatar tamanho crime,
E eterna a voz me gelará nos lábios.
Lira da minha pátria onde hei cantado
O lusitano _envilecido_ nome,
Antes que nesse escolho, em praia estranha,
Quebrada te abandone, este só brado
Alevanta final e derradeiro:
Nem o humilde lugar onde repoisam
As cinzas de Camões, conhece o Luso.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

1 de Abril, Poema do Dia

Quando a suprema dor muito me aperta
se digo que desejo esquecimento,
é força que se faz ao pensamento,
de que a vontade livre desconcerta.

Assi, de erro tão grave me desperta
a luz do bem regido entendimento,
que mostra ser engano ou fingimento
dizer que em tal descanso mais se acerta.

Porque essa própria imagem, que na mente
me representa o bem de que careço,
faz-mo de um certo modo ser presente.

Ditosa é, logo, a pena que padeço,
pois que da causa dela em mim se sente
um bem que, inda sem ver-vos, reconheço.